header materia 5
Automobilismo

Entrevista exclusiva com o comissário da Fórmula 1, Felipe Giaffone 

(por Bruno Braz) Felipe Giaffone é um piloto de automobilismo, atualmente competindo pela Fórmula Truck. Vem de uma família com longo histórico no automobilismo, além de ser empresário do meio, onde é proprietário do Kartódromo Internacional da Granja Viana, em Cotia – SP.Giaffone é o maior ganhador da Fórmula Truck nos últimos anos, sendo campeão em 2007, 2009, 2011 e 2016, além dos vice-campeonatos em 2010 e 2012. Em 2017 foi campeão da Copa Truck. Também trabalhou como comentarista do canal SporTV/Globo, além da Band, para onde retorna em 2021 na equipe que cobre a Fórmula 1. Com boa passagem pela Indy e IRL, venceu corridas (Michigan em 2000 e Kentucky em 2002), tendo como melhores resultados dois quartos lugares na classificação, além de um terceiro lugar nas 500 milhas de Indianópolis, que por muito pouco, não se tornou vitória.Também ajuda pilotos iniciantes, como esse que vos escreve, com dicas importantes sobre seu equipamento e alguns cuidados que precisam ter, quando resolvi competir uma temporada no kartismo profissional.Felipe atuou também como comissário FIA em GPs de F1, F2, WTCC e Fórmula E. Confira como foi o bate-papo. BRUNO BRAZ: Felipe, como foi o seu desenvolvimento em termos de bagagem, desde as categorias como o Kart, Fórmulas de Base, Indy e Truck? O que foi mais difícil no começo?FELIPE GIAFFONE: Comecei como a maioria, no kart, com 12 para 13 anos. No kart, meu pai ajudava. Depois a gente teve a fábrica de kart, que me ajudou muito a melhorar como piloto, porque você acaba desenvolvendo muita coisa. O momento mais complicado, é quando você vai para fora, no caso em que fiquei na Indy Lights, sem patrocínio total.Voltei para o Brasil, sem patrocínio. Acabei conhecendo o Flávio de Andrade, que era o presidente da Souza Cruz, voltando para a Indy Lights, onde fiquei 3 anos com o patrocínio da Souza Cruz, na época a Hollywood, mas, que foi sempre muito tenso. Quando você depende puramente de desempenho e patrocínio, a pressão é muito grande. Foi muito bom, mas ao mesmo tempo, tem que gostar muito para passar por tudo o que eu passei no começo de carreira. Se estiver com a cabeça um pouco fora do lugar, você volta para o Brasil correndo. Acho que foi o momento mais difícil. BRUNO BRAZ: Qual é o papel de um comissário? Eles também definem a penalidade que será imposta ao piloto ou isso fica a cargo da direção de provas?FELIPE GIAFFONE: Quem pune são os comissários, não o diretor de prova. O diretor de prova faz a corrida. Ele tem que tomar conta da corrida. Dar a largada, ver bandeiras amarelas nos locais, cuidar da segurança da pista. Quando há algum incidente, alguma batida, isso sai da mão do diretor de provas, justamente para ele não tirar a atenção da corrida. E isso vai para a sala dos comissários. Hoje na F1 são 4 comissários: 1 principal, 1 segundo comissário, o comissário piloto e um comissário da pista local, que é indicado pela confederação local. São eles que definem se há uma punição, ou não, e passam para o diretor de prova, que faz o comunicado. BRUNO BRAZ: Como essa experiência toda em automobilismo ajuda na análise de um caso enquanto comissário desportivo de F1?FELIPE GIAFFONE: Para você fazer essa análise, eu diria que um bom grupo, o colegiado de comissários, precisa de pessoas diferentes. Você precisa de uma pessoa muito boa, ou advogado, ou um contador. Um cara bom de escrever, de ler, de procurar, para não deixar passar alguma coisa. Depois você precisa entender um pouco da competição, jogo de cintura. Às vezes, o que está preto no branco, não necessariamente é o caminho para ir. Se tiver alguma brecha, que as vezes, você deixa só na mão do advogado, ele pode simplesmente querer ir ali, na vírgula, e as vezes não é o que acontece.Piloto já é bem complicado. Você tem bons pilotos comissários e pilotos horríveis. Eu me incluo nessa. A primeira vez que te colocam como comissário, você quer ir atrás de cada detalhe, preocupado, querer punir. Demora um bom tempo para você entender o que realmente rola, para analisar com calma. Então, é experiência. Experiência desde o kartódromo que eu tenho, como promotor. Também já fui comissário, indiretamente em todos esses anos de kart. Acho que o piloto, para ser comissário, tem que ter a cabeça bem tranquila, porque é muito fácil de você errar. BRUNO BRAZ: Olhando de casa, nós temos o lance ao vivo e os ângulos que a transmissão nos oferece. Às vezes, naquele momento, você olha e pensa “foi culpa do fulano”, mas, tem ocasiões em que, alguns dias depois, surge um outro ângulo que você reanalisa e pensa “olhando bem, se o ciclano não tivesse dado essa puxadinha, o fulano não tinha tocado”. O que vocês possuem de recursos disponíveis para realizar a melhor tomada de decisão?FELIPE GIAFFONE: Na sala de comissários, obviamente temos acessos a todas as câmeras, mas tem uma pessoa, destinada, que vai para todas as provas. Lembrando que os comissários mudam. Eles não têm um grupo fixo, para não criar uma proteção. Se o comissário é italiano, vão falar que é da Ferrari, se é alemão, vão falar que é da Mercedes, inglês, da Williams. Então, eles tentam ir mudando o colegiado. A gente tem um comissário, que segue o campeonato inteiro, que passa para os comissários, todas as imagens. Então você tem: todas as imagens, todos os rádios gravados dos pilotos, todas as onboards, as câmeras obviamente que tem na televisão, mais um conjunto de câmeras fixas. Essas não aparecem na TV, que são câmeras paradas, mais ou menos igual temos no kartódromo. Até copiei na Granja essa ideia, onde você não perde nenhum lance. Se a câmera não mostrou bem tudo, você tem 40, 50 câmeras paradas, que cobrem a pista inteira, além da telemetria gravada e simultânea de todos os carros. Tem bastante coisa para analisar. Às vezes, isso tudo acaba atrapalhando, porque ao mesmo tempo, você tem que ser o mais rápido possível. BRUNO BRAZ: Já houve algum momento desses de decisão, onde você foi voto vencido?FELIPE GIAFFONE: Sim, algumas vezes. Como também teve algumas que eu decidi e, depois eu vi que eu estava errado mesmo. É ponto de vista. Quando é uma dessas batidas subjetivas, cada um pode interpretar. Os próprios pilotos sobem e, eles que estavam lá, acham que a culpa é do outro. Quando chega naqueles incidentes que é muito complicado, duvidoso, é normal acontecer. Não é um erro. É uma interpretação diferente que depois, de ouvir, falar, depois vê que interpretou de um jeito que poderia ter sido ao contrário. É chato, mas, eu diria que aconteceu com a maioria dos comissários. BRUNO BRAZ: Assim como existem personalidades diferentes, existem estilos de pilotagens diferentes. Existe aquele comissário que é mais permissivo que outro talvez por ter sido mais arrojado?FELIPE GIAFFONE: Sim. Nos comissários existem estilos diferentes. Você tem comissário que tem uma voz mais forte, que é mais agitado, que quer decidir. Então, é por isso que é bem escolhido a dedo. Acho que quando você tem um comissário, que quer mandar demais, não é bom. Isso acontecia muito no passado, anos atrás, onde era o próprio diretor de provas que decidia e acabava atropelando os comissários. Hoje em dia está bem mais profissional. BRUNO BRAZ: Qual foi a situação mais complexa que caiu para você decidir?FELIPE GIAFFONE: Situação mais complexas tiveram algumas. Até por um acordo com a FIA, nenhum comissário pode falar exatamente de um incidente. Assinamos um documento que não nos permite falar de um caso específico, mas tem alguns casos que são mais complexos, mais chatos. A última corrida que eu fiz, teve uma equipe entrando contra a outra, no final do ano. A Haas contra a Racing Point. Foi a última corrida que eu fiz, em Abu Dhabi. Essa foi bem chata. Era muito documento para ler, muita coisa para definir. Eu lembro que foi tenso essa.BRUNO BRAZ: Existe alguma dificuldade adicional em ser comissário da F1?FELIPE GIAFFONE: Eu diria que não. O problema é que você está sempre muito exposto. Talvez esse seja o problema. Mas é como qualquer outra corrida. Você tem todas as informações. A única coisa é que você tem uma pressão maior, o envolvimento de todas as equipes, imprensa. Então isso acaba expondo um pouco mais. BRUNO BRAZ: Existem pilotos na F1 que não compreendem a decisão de vocês, mesmo com anos de bagagem?FELIPE GIAFFONE: Piloto, desde o kart até a Fórmula 1 acha que está sempre com a razão. Isso é normal. Não quero citar nomes, mas tem os chatos e também tem os superlegais, que sobem lá, compreendem e dão apoio. Ajudam os comissários da melhor forma possível. Então isso realmente não muda do kart até a F1. BRUNO BRAZ: Por fim, o que é “pior”: fazer a avaliação de um lance de um GP fechado em uma sala, ou comentar um GP ao vivo sabendo que há milhões de pessoas assistindo?FELIPE GIAFFONE: Ah, essa é boa. A primeira vez que eu entrei em uma sala de comissário, e vi tudo aquilo, sem nenhuma voz… E você não pode ligar nada para não ser influenciado por nenhuma TV, site de rádio ou algo assim. Então, a coisa mais estranha é você ver um GP de F1 com todas as informações em silêncio, dentro de uma sala, que hoje em dia, a maioria delas, você não tem nem vista para a prova, porque é só televisão. Então, isso é complicado. Eu vou te falar que eu prefiro muito mais comentar, porque, é obvio que você tem a pressão, um monte de gente assistindo, você não pode errar, mas, eu prefiro falar do que eu conheço, do que eu vejo, do que ter todo aquele monte de papel e aquela tensão de subirem dois pilotos bravos lá. Acho que é mais chata a parte de comissário. 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *